Uma atriz singular

Nathalia Timberg é uma atriz dotada de invejável energia. Além de se envolver em projetos inéditos – está em cartaz com 33 Variações, texto de Moisés Kaufman que ganhou a cena sob a direção de Wolf Maya – e desafiadores – como Tríptico Samuel Beckett, montagem de Roberto Alvim –, tem, desde o início desse ano, um teatro em seu nome, uma iniciativa idealizada por Maya.
Dona de uma carreira consistente, a atriz construiu sólida formação artística na escola de Jean-Louis Barrault, na França, ingressando, na volta ao Brasil, na Companhia Dramática Nacional, onde se deparou com o desafio de fazer Senhora dos Afogados (1954), de Nelson Rodrigues, sob a condução de Bibi Ferreira. Ingressou no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), prestigiada companhia fundada pelo industrial italiano Franco Zampari, e participou ativamente do Grande Teatro, na televisão, acumulando experiência nas encenações dos mais importantes exemplares da dramaturgia brasileira e estrangeira.

Nathalia firmou parcerias duradouras ao longo do tempo. Em primeiro lugar é preciso mencionar Sergio Britto, com quem trabalhou no TBC, no Grande Teatro e, nos anos 1980, em montagens do Teatro dos Quatro. Atuaram juntos desde cedo em Quebranto (1949), de Coelho Neto, O Pai (1949), de August Strindberg, A Casa de Chá do Luar de Agosto (1956), de John Patrick, e Um Panorama Visto da Ponte (1958), de Arthur Miller. Encenaram três vezes a mesma peça, Meu Querido Mentiroso, de Jerome Kilty, em 1964, 1989 e 1998. Nathalia, inclusive, foi premiada pelas duas primeiras montagens. No Teatro dos Quatro contracenaram em Assim é... se lhe Parece (1985), de Luigi Pirandello, na qual interpretou a Sra. Frola, A Cerimônia do Adeus (1986), como a Simone de Beauvoir dos sonhos de Juliano, alterego do autor Mauro Rasi, e O Jardim das Cerejeiras (1989), de Anton Tchekhov, na pele da matriarca Liuba.

Estabeleceu outro vínculo sólido com Eduardo Tolentino de Araújo, diretor do Grupo Tapa, que a conduziu nas montagens de A Importância de ser Fiel (2003), de Oscar Wilde, Melanie Klein (2004), de Nicholas Wright, e Sopro de Vida (2010), de David Hare. É difícil listar todos os espetáculos relevantes em sua trajetória, mas cabe mencionar o austero A Balada de Zerline (1988), de Hermann Broch, e o elegante Três Mulheres Altas (1995), de Edward Albee, no qual contracenou com Beatriz Segall e Marisa Orth.

Fiel aos próprios princípios, Nathalia permanece uma defensora da palavra em tempos em que ela parece cada vez mais banalizada. A atriz sabe que não é preciso ceder ao popularesco para buscar a interação com uma ampla camada de espectadores. Mesmo não tendo atingido plenamente os objetivos ambicionados, o ousado projeto do Circo do Povo, que capitaneou nos anos 1970, foi uma empreitada importante nesse sentido.

Texto adaptado de matéria publicada no Jornal do Brasil