Vida: todas as artes têm o compromisso de explicitá-la, nas linguagens múltiplas em que se apresentam (opção do artista), mas a que mais radicaliza essa explicitude, é, sem dúvida, o Teatro e, mais especificamente, a interpretação (ator) teatral. No momento em que o teatro, ou melhor, a arte da interpretação acontece a partir de um encontro direto entre o emissor/ator e o receptor/público, estamos ali correndo os riscos inerentes à vida - inclusive morrer - e essa possibilidade múltipla e imponderável do viver e do atuar é o que me atrai naquilo que os céus me impuseram como destino – ser ator.

A repetição, pergunta recorrente que os leigos me fazem sobre o ato de atuar é, na verdade, uma ação sistemática de exercícios de aprimoramento que não podemos dizer (ainda) que é arte, pois ela se dá, quando se dá, depois de três meses de ensaio, 200 apresentações, em um único segundo, numa única pausa, num único olhar, num único ouvir e, nesse instante, depois de um processo de meses/anos, quando ele acontece, atingimos a essência – e a excelência – do ser humano que habita em nós, ou seja, atingimos a divindade. Tornamo-nos deuses, não nos repetindo, não criando simplesmente arte, mas criando vida através da arte, que é a proposta maior do ser humano, seja ele um simples pedreiro ou um simples ator.O resultado de tudo isso, às vezes, mas nem sempre, é um prêmio, mas ele não paga o preço da nossa solidão criativa.

Tonico Pereira
8 de abril de 2008