ANTÔNIO E CLEÓPATRA
por Felipe Cabral


Lugar nenhum. Diversos caminhos se confundem em montagem de Shakespeare inédito no Brasil.

As dificuldades de produção fizeram com que a idéia da atriz Maria Padilha de montar um texto não muito encenado de Shakespeare esperasse um certo tempo para se concretizar. Durante três anos, ela pôde experimentar algumas dessas peças em leituras, com elenco e direção diversas. Finalmente com patrocínio e produção esquematizada, ela lidera o elenco de "Antônio e Cleópatra", texto inédito do dramaturgo no país, que ganha montagem com ares de superprodução, em cartaz no Sesc Ginástico até o próximo mês.

A grandiosidade do espetáculo - com dez atores e dezenas de figurinos - é que o chama a atenção logo de início. E justamente neste aspecto se encontram algumas questões que logo vem à tona com a encenação, como adotar ou não um "caráter espetaculoso" para a cena ou mesmo priorizar o complicado e extenso texto em detrimento de uma maior comunicabilidade com a platéia. A direção/adaptação de Paulo José não se define entre estas alternativas e sustenta a montagem na tensão do limite de diversos caminhos e opções sem seguir nenhum deles, efetivamente.

Logo no começo, ele faz bom uso de um didático prólogo e, nas cenas posteriores, insere outros elementos - cenográficos e dramáticos - com o mesmo fim de identificar as personagens e a trama, situando o espectador. Com o passar do tempo, o caráter político do texto ganha força, deixando a "história de amor" - que o programa define como o centro da peça - de lado. O próprio desenvolvimento dos personagens-título também acaba ficando pelo meio do caminho.
A "ambientação" inicial proposta para o luxurioso relacionamento dos dois é logo esquecida e, ao querer dar conta de diversas tramas em algumas cenas que não contribuem para a ação central, a montagem acaba esvaziada de conteúdo e significado. Entre uma cena e outra, há alguma inserção que pretende retomar a idéia de "aproximação" com o público. Para isso, utiliza recursos cômicos que parecem sobrar em cena. Caso de uma versão da música "No, woman, no cry", de Bob Marley, que finaliza uma cena supostamente dramática de Cleópatra.

O cenário de Helio Eichbauer é bem solucionado e tem como principal elemento uma cortina de persianas, onde são projetadas as localizações de diversas cenas, além de mapas e algumas "legendas". A sobriedade cenográfica encontra interessante contraste com os exuberantes figurinos de Kika Lopes, que investe em máscaras e muitos acessórios, principalmente para o coro. A montagem ainda conta com os músicos Lucas Vasconcellos e Rafael Rocha, que fazem algumas intervenções sonoras.

Clarice Niskier, Ana Kutner e Paulo Hamilton seguram alguns momentos do espetáculo com atuações mais inspiradas. Mario Borges compõe burocraticamente seu Enobarbo, enquanto Flavio Bauraqui segue monocórdio como Otávio César, até pela certa falta de função que a personagem ganha em certos momentos da trama. Caco Ciocler tenta sair do estereótipo de Marco Antônio e Maria Padilha sublinha um aspecto frágil de Cleópatra, flertando com a comédia em determinadas cenas.

Ainda que certas propostas da direção possam encontrar eco na platéia, a montagem é prejudicada por uma certa falta de eixo narrativo e pela falta de uma "linha" de direção mais bem definida. O espetáculo, então, termina por frustrar aquelas que seriam suas ambições iniciais: evidenciar o texto inédito de Shakespeare e apresentar um espetáculo comunicativo e de grande porte.

 


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